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Subida de juros leva famílias a mudar para casas mais baratas?

Alta inflação e escalada de juros já estão a ter vários efeitos no mercado residencial, explicam especialistas ao idealista/news.

Mudar de casa em Portugal
Foto de SHVETS production no Pexels
Autores
 Vanessa Sousa 
 Tânia Ferreira

A carteira das famílias tem vindo a ser pressionada pela alta inflação que se faz sentir em Portugal. E quem está a pagar um crédito habitação de taxa variável (cerca de 90% do total dos contratos) sente o orçamento ainda mais apertado por via da subida a pique da prestação da casa. Isto porque as taxas de juro associadas aos empréstimos habitação continuam a aumentar. Muitos agregados, sufocados pelas elevadas taxas de esforço, começam a procurar alternativas e mudar para casas mais baratas surge como solução, tal como explicam especialistas de mercado ao idealista/news. Mas esta tendência não se sente, de momento, em todos os negócios imobiliários, nomeadamente no segmento de luxo.

Ao longo de 2022, a vida dos portugueses foi-se tornando cada vez mais difícil à medida que a inflação e os juros dos créditos habitação de taxa variável escalavam degrau a degrau. Houve quem visse as prestações da casa aumentar centenas de euros, em função do ano do contrato e do capital em dívida, com as taxas Euribor a sair de terreno negativo para se fixarem entre 2% e 3,5% atualmente – valores que começam a equiparar-se aos registados na crise financeira de 2008.

E o arranque deste ano continua na mesma tendência, antecipando-se mesmo um agravamento, uma vez que o BCE decidiu na passada semana, dia 2 de fevereiro, voltar a aumentar as taxas de juro diretoras em 50 pontos base, elevando a taxa de refinanciamento para 3%. Christine Lagarde, presidente do regulador europeu, anunciou que vai voltar a fazê-lo na reunião de março (também em 50 pontos). E assim continuará até que a inflação baixe para patamares que o “guardião” do euro considere saudáveis para o funcionamento da economia.

Já há famílias a trocar de casa para reduzir prestação

Perante a dificuldade em pagar prestações da casa mais elevadas e o risco de incumprimento, as famílias andam a fazer contas à vida e há quem comece a optar por mudar de residência. A ideia passa por trocar de casa para uma mais barata, de forma a que o custo com a habitação seja mais baixo e, assim, mais acessível aos seus orçamentos. Este é, de resto, um movimento detetado por vários mediadores imobiliários contactados pelo idealista/news.

“Desde que foi anunciado o aumento das taxas de juro no crédito habitação, muitas foram as famílias que nos procuraram, sobretudo no último trimestre de 2022, com o objetivo de trocar de casa e, consequentemente, reduzir os custos com a sua habitação atual”, começa por explicar Guida Sousa, diretora e coordenadora nacional da Decisões e Soluções. Para encontrar casas mais baratas e conseguir reduzir a sua taxa de esforço no crédito habitação, as famílias decidiram “reduzir algumas comodidades que tinham” em casa ou até “trocar de zona de residência para zonas mais periféricas das cidades”.

Também Patrícia Santos, CEO da Zome, tem sentido “uma tendência crescente de mudança de casa devido à subida das taxas de juro no crédito habitação e do agravamento do custo de vida”, sendo esta uma forma de “otimizar o seu orçamento familiar”. Além disso, tem também notado que há famílias que estão “a vender a segunda habitação, aproveitando a valorização dos imóveis para aumentar a liquidez, e há ainda quem esteja a mudar para casas mais adequadas às suas reais necessidades”, nomeadamente casas com menores divisões, mais funcionais e sustentáveis.

Os profissionais notam, assim, que há “um acréscimo de contactos por parte de clientes que começam a tentar perceber e conhecer alternativas que lhes permitam reorientar as suas responsabilidades e condições de vida”, tal como relata Luís Nunes, diretor geral da ComprarCasa, precisando que “a tendência passará pela venda e compra de um outro imóvel”, porque o mercado de arrendamento apresenta uma “oferta reduzida e pouco apelativa”. Ressalvando que este aumento de contactos não é ainda relevante, o responsável conta que, na sua rede, se tem “verificado a procura de resposta, na compra e venda, em mercados mais limítrofes que lhes possibilitem ter as mesmas condições de habitabilidade (exceto, a localização), com um serviço da dívida mais adequado à situação atual”.

Comprar casa nas periferias
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Isto está a acontecer porque, na última década, as famílias tiveram uma maior margem de endividamento – derivada da Euribor negativa e doconsequente desconto no spread que, juntos, ajudavam a baixar as taxas de esforço no crédito habitação -, a par de uma maior capacidade de poupança, gerada pelo menor custo de vida e baixa inflação. E a verdade é que muitas famílias agarraram a oportunidade de conseguir um maior financiamento para comprar casas de tipologias superiores às suas necessidades (em T3 em vez de T2, por exemplo), em zonas mais caras e por valores que, hoje, mostram-se desajustados aos seus rendimentos.

“Com os níveis de taxas que andámos a viver, o encargo mensal de um imóvel superior ao que necessitava era perfeitamente comportável. Ora, a realidade hoje é outra. Agora, é o momento de repensarem essas mesmas opções e reorientá-las de acordo com as reais necessidades da família”, analisa Luís Nunes, da ComprarCasa.

É isso mesmo que confirma Miguel Cabrita, responsável pelo idealista/créditohabitação em Portugal: “O encarecimento dos créditos habitação faz com que as famílias não tenham tanta capacidade de endividamento e, por sua vez, menos capacidade de chegar aos valores que chegavam anteriormente”. E é precisamente devido à “maior dificuldade na obtenção de empréstimo habitação que hoje se sente”, que faz com que as famílias “optem por casas mais baratas e consequentemente se afastem para as periferias das grandes cidades”, explicou ainda o especialista, recorrendo a um exemplo.

“Se há um ano um casal com um rendimento de 1.500 euros ou 2.500 euros mensal podia chegar a financiamento na ordem dos 220.000 euros ou 360.000 euros, hoje a capacidade de endividamento caiu 60.000 euros e 100.000 euros, respetivamente”, ilustra Miguel Cabrita.

Dificuldades em pagar a prestação da casa apertam no início de 2023

Os especialistas antecipam que o grande choque com o aumento das prestações da casa será sentido ainda na primeira metade de 2023, e até mesmo agora no primeiro trimestre. Segundo os dados do Banco de Portugal (BdP), 54% dos créditos habitação de taxa variável terão a prestação da casa atualizada no atual mês de fevereiro.

“Acreditamos que ainda no primeiro trimestre deste ano algumas famílias, com menos recursos económicos, sentirão dificuldades em pagar os créditos habitação e ver-se-ão obrigadas a vender a casa, enquanto o mercado imobiliário está em alta. Caso contrário, como já aconteceu no passado, correm o risco de o valor de venda do imóvel não ser suficiente para pagar a hipoteca”, alerta Guida Sousa, da Decisões e Soluções. E a especialista acrescenta ainda que não tem dúvidas “de que as famílias mais carenciadas e com créditos habitação recentes vão sofrer grande pressão no seu orçamento”, até porque a escalada da inflação na União Europeia está a penalizar, sobretudo, os mais pobres, tal como aponta estudo recente do ‘think tank’ bruegel, citado pelo Expresso.

Também a CEO da Zome prevê que “o choque nas prestações do crédito habitação irá acontecer durante o primeiro semestre de 2023”. Mas considera que “a tendência de mudança [de casa] causada pela subida das taxas de juro seja temporária e não se acentue no futuro”, tendo em conta que as taxas Euribor tenderão a baixar até 2025, aliviando as prestações. Ainda assim, Patrícia Santos está convencida que “as mudanças de casa continuarão seguramente a existir, pois notamos que há uma crescente valorização da liberdade financeira para viajar, socializar, e investimento no bem-estar”.

Comprar casas mais baratas
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Renegociação do crédito habitação é alternativa à troca de casa

Com a inflação em alta – embora esteja a dar sinais de descida (o INE estima que ter-se-á fixado em 8,3% em janeiro) – e num contexto de subida dos juros, há cada vez mais famílias a ter dificuldades em pagar as prestações da casa. Para ajudar a mitigar estes efeitos, o Governo socialista de António Costa decidiu colocar em marcha várias medidas, que estarão em vigor até ao final de 2023:

  • Novas regras para renegociar o crédito habitação: uma medida que proíbe o aumento dos juros e elimina custos associados à redução da prestação, por exemplo, a comissão por alargamento do prazo do contrato. Explicamos tudo aqui.
  • Amortização antecipada sem custos: além de renegociar o empréstimo, o diploma permite amortizar total ou parcialmente o crédito habitação de qualquer valor e sem quaisquer custos, já que é eliminada a comissão de 0,5%.
  • Desconto no IRS para quem paga empréstimos habitação: esta medida inserida no OE2023 permite aos trabalhadores que auferem um salário bruto de até 2.700 euros/mês e que estão a pagar um crédito habitação própria e permanente, de baixar um patamar na retenção de IRS.

Estas iniciativas desenhadas pelo Executivo – que os bancos são obrigados a implementar sem colocar os clientes na lista negra do Banco de Portugal – acabam por funcionar como uma primeira alternativa antes de se avançar com a decisão de mudar de casa.

É isso mesmo que diz o CEO da iad Portugal: “Ainda relativamente cedo para perceber o alcance do impacto das prestações e consequente reação dos proprietários”. Isto porque “os casos mais agudos passam, numa primeira fase, pela tentativa de renegociação dos créditos e só numa fase posterior, e dependendo da evolução das taxas de juro, a tomada de decisões mais drásticas, como a da alienação do imóvel”, argumenta Alfredo Valente ao idealista/news.

Os dados mais recentes do BdP confirmam que há cada vez mais famílias a optar por renegociar o crédito habitação. Em dezembro de 2022, a percentagem relativa a reestruturações de créditos ascendeu a 22% das novas operações de crédito, um valor bem superior ao registado em dezembro do ano anterior (6%). Mas “caso a renegociação do crédito com o banco ou transferência para outro não seja possível ou suficiente para reduzir a taxa de esforço”, as famílias com rendimentos mais baixos e créditos habitação mais recentes “não terão outra solução senão trocar de casa ou vender”, alerta Guida Sousa.

Renegociação do crédito habitação
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Também na visão de Massimo Forte “ainda é cedo para percebermos se começa a existir pressão na mudança de casa neste sentido”, indicando que as empresas com quem trabalha ao nível da consultoria de mediação imobiliária “não têm sentido esta tendência, pelo menos ainda e em número que seja relevante”. O que se tem “notado muito mais é a retração na procura de casa para comprar (…) nos mercados médio, médio/baixo e baixo onde a dependência do financiamento para comprar casa é quase total”, revela o consultor independente especializado em mediação imobiliária.

E há outros especialistas de mercado que também ainda não sentiram movimentos de mudança de casa derivados da subida dos juros. É o caso de Patrícia Barão, Head of Residential da JLL, que diz não ter ainda dados “que consubstanciem esta diferença”, destacando que “o Governo anunciou medidas de apoio para as famílias que possam estar ‘estranguladas’”, pela alta subida dos juros nos empréstimos habitação.

A mesma perceção tem Ricardo Sousa, CEO da Century 21 Portugal, frisando mesmo que “não antecipamos esse movimento”. E explica porquê: “As famílias e as instituições financeiras estão hoje muito mais bem preparadas e muito menos expostas ao risco de incumprimento, em comparação com o que se verificou no período 2008-2011. Por isso, acredito que as famílias portuguesas não estarão sujeitas a uma forte pressão para venda dos seus imóveis”, conclui Ricardo Sousa.

Já Rui Torgal, CEO da ERA Portugal, conta que “ao dia de hoje, os dados não nos indicam esta transição”, mas não descarta que possa vir a acontecer no futuro. Este responsável assume assim que, embora não se sinta hoje uma tendência de mudança de casa pela subida a pique dos juros, o cenário atual terá consequências para os negócios. “Apesar de não estarmos a sentir alterações significativas em virtude do atual contexto, estamos conscientes que é inegável que o aumento das prestações mensais do crédito habitação vai tirar liquidez ao orçamento mensal das famílias portuguesas e que isso tem consequências para a economia e, por inerência, para o setor imobiliário”, analisa em declarações ao idealista/news.

Prestações da casa mais caras
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Mudança de casa no segmento de luxo não se observa

A realidade no segmento alto é bem particular, desde logo porque estas famílias recorrem muito menos ao financiamento bancário para comprar casa do que os segmentos médio e médio baixo do mercado residencial. E, por isso, quem compra casas de luxo não sentirá tanto o impacto da subida a pique das taxas de juro nos créditos habitação, segundo defendem os especialistas.

“O segmento de mercado alto e médio alto, onde operamos, é menos sensível à alteração das taxas de juro”, esclarece Rafael Ascenso, diretor geral da Porta da Frente Christie’s, sublinhando que “não é um segmento muito endividado como o médio e o médio baixo”. E o mesmo diz Miguel Lacerda, Lisbon Residential Director da Savills: “Os condicionamentos e dificuldades financeiras são muito menos sentidos no mercado onde a Savills atua, direcionado para um target, ‘medium high/ high-end’”. E a verdade é que no segmento de luxo “a procura permanece muito sólida sustentada por fortes fundamentos de mercado”, frisou ainda Miguel Lacerda.

Na Engel & Völkers em Portugal também não se tem sentido “um grande impacto no aumento das taxas de juro das hipotecas e do aumento do custo de vida”, dado que “a maioria dos seus clientes não está dependente do crédito para a sua compra e, portanto, não são afetados por esta situação”, explica Constanza Maya. “Neste sentido, não temos casos de clientes que decidam vender as suas casas porque não podem pagar o aumento da sua hipoteca”, acrescentou ainda a diretora de expansão e operações da Engel&Völkers para Portugal, Espanha e Andorra.

Por enquanto, o mercado de luxo permanece de boa saúde, tendo em conta estes testemunhos. No entanto, o diretor geral da Porta da Frente Christie’s avisa que também que o rumo do segmento de luxo poderá ser influenciado no futuro pela subida das taxas de juros, traçando duas hipóteses:

  • Se a situação da subida dos juros for temporária, acredita que “não irá ter grande impacto”, uma vez que as famílias que contraíram dívida para comprar casas de luxo “têm alguma capacidade financeira para suportar esta subida das taxas de juro”, explica;
  • “Se se prolongar no tempo, aí sim, poderemos começar a assistir à colocação de casas no mercado, quer para venda, quer para arrendamento. Mas penso que será mais para venda”, acrescenta Rafael Ascenso.
Comprar casas de luxo
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Quais são os outros efeitos da subida dos juros no negócio das casas?

O mercado imobiliário está, portanto, perante vários desafios, mas também surgem novas oportunidades de negócio. Em termos práticos, o efeito da alta inflação e da subida dos juros nos créditos habitação está a ter ainda outros impactos nos negócios das mediadoras imobiliárias contactadas pelo idealista/news, que se sentem, sobretudo, nos segmentos médio e médio/baixo:

  • Maior volatilidade do mercado residencial;
  • Prazos de venda das casas dilatados: o processo de decisão está a levar mais tempo por haver uma maior prudência na decisão de compra;
  • Procura por casas de menores dimensões;
  • Maior procura de casas nas zonas periféricas das grandes cidades;
  • Desconto no preço das casas a aumentar: a diferença entre o preço pedido pelo proprietário e o preço final do negócio tende a ser maior;
  • Aumento da procura por casas para arrendar;

Nos últimos meses, Beatriz Rubio, CEO da Remax Portugal, tem sentido “uma redução da atividade do mercado por conta da quebra da procura mais receosa e menos confiante (…) Muitas famílias alargaram o seu espectro de pesquisa, abrangendo áreas e zonas que não foram a sua primeira escolha, mais distantes e menos acessíveis, mas também reduziram as áreas e tipologias procuradas. Na prática, estão a adaptar o seu rendimento disponível e as condições menos favoráveis do crédito, ao redefinirem o que procuram”, conclui Beatriz Rubio em declarações ao idealista/news.

“É normal que a volatilidade aumente, que os prazos médios de venda dilatem e que o desconto implícito aumente, pelo que é muito importante gerir corretamente as expectativas dos proprietários”, resume Alfredo Valente, CEO da iad Portugal.

Também Luís Nunes, da ComprarCasa, admite que a subida da inflação e dos juros nos empréstimos “estão na origem da, pelo menos, estagnação da procura imobiliária. Sem dúvida que já se sente uma pequena retração da procura”, frisa o especialista. E Miguel Lacerda, da Savills, antecipa que “o ritmo de vendas possa sofrer uma ligeira desaceleração, com os processos de decisão a levarem mais tempo”, embora considere que será uma situação temporária.

Sobre a retração da procura de casa, Massimo Forte alerta que pode haver ainda poder de influenciação entre famílias que planeiam comprar casa. “Se houver muitas pessoas a não considerar a compra de casa, justificando a sua decisão com o impacto das mudanças conjunturais que dificultam a aquisição para quem recorre a financiamento (…), pode surgir um efeito persuasivo denominado de prova social, ou seja, uma espécie de boato ‘credível’ que ‘hoje não é possível ou não é conveniente comprar casa’, o que originará uma tendência de retração da procura”, explica o consultor.

Mudança de casa pela subida dos juros
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Procura de casas está a mudar: maior aposta no arrendamento e permutas

O atual contexto económico está a criar várias tendências na procura de casas que já estão identificadas e que resultam em novas oportunidades de negócio. Além das famílias começarem a procurar casas mais pequenasmais baratas e localizadas nas periferias das grandes cidades, há ainda outros movimentos já sentidos pelos especialistas ouvidos pelo idealista/news:

  • Mais procura de casas para arrendar: “Já se assiste a um aumento da procura por arrendamento ao invés da aquisição de imóveis com receio da subida da prestação do crédito à habitação”, adianta Guida Sousa, da Decisões e Soluções, admitindo que no atual contexto, “o arrendamento torna-se mais apetecível e, por vezes, a única alternativa para muitas famílias”. Também Massimo Forte acredita que o arrefecimento da procura de casas para comprar “poderá dinamizar o mercado de arrendamento nas zonas mais periféricas das grandes cidades”. Esta é uma visão partilhada por Patrícia Barão, da JLL, que diz que o facto de o acesso à primeira habitação estar “mais difícil”, “pode efetivamente restringir uma parte da procura que, não tendo capacidade de financiamento ou poupanças, acaba por arrendar casa em vez de comprar”.
  • Procura por casas para remodelar: a diretora e coordenadora nacional da Decisões e Soluções também tem notado “um aumento da procura por imóveis a preços mais acessíveis e, sobretudo, para remodelar, não só para habitação própria como, em alguns casos, para investimento”.
  • Procura de casas para famílias inteiras: outro movimento que se tem sentido no mercado passa por comprar casas para agregar toda a família e, assim, reduzir os custos com várias casas. “Existe também maior procura por imóveis de maiores dimensões para coabitação (entre irmãos, pais e filhos, por exemplo), tanto para aquisição como para arrendamento e em vilas e aldeias com menos densidade populacional”, partilha ainda Guida Sousa.
  • Permutas estão a aumentar: a responsável nacional da Decisões & Soluções diz ainda que se têm realizado “algumas permutas vantajosas entre proprietários”. As permutas técnicas ocorrem quando há um acordo entre as partes interessadas para realizarem uma troca de casas. Para isso, determinamcondições, acertam valores e realizam uma operação que envolve valores mais reduzidos e menos impostos. Estas operações, que foram vistas como uma boa solução para trocar casas na anterior crise, estão a ganhar relevância. Mas, agora, com as novas regras do OE2023 estão em risco de perder atratividade.
  • Aumento da procura de casas pelo segmento alto: Rafael Ascenso, da Porta da Frente Christie’s, admite que haverá “uma redução da procura daqueles que compram a crédito, mas um aumento da procura por parte dos que têm liquidez no banco que todos os dias é reduzida pela inflação. Ou seja, se a inflação se mantiver a níveis elevados, o imobiliário será sempre o melhor refúgio para quem tem liquidez”, explica.
Procura de casas em Portugal
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Preços das casas a estabilizar com redução da procura e aumento (ligeiro) da oferta

A somar à alta inflação e à subida dos juros no crédito habitação, há ainda outro fator que contribui para o arrefecimento da procura de casas em Portugal: os altos preços das habitações à venda, que resultam, sobretudo, da alta procura para uma oferta estruturalmente escassa. Mas poderá o novo contexto ajustar ospreços? Os especialistas acreditam que os preços das casas poderão, pelo menos, estabilizar, antevendo que desacelerem o seu crescimento, como de resto se começa a ver pelos dados mais recentes.

Isto porque a procura de casas tende a arrefecer e a oferta de casas novas até poderá aumentar – ainda que ligeiramente. Alfredo Valente, da iad Portugal, partilha que se tem assistido “nos últimos meses a um volume interessante de imóveis a chegar ao mercado, mas fundamentalmente em resultado de estratégias de desinvestimento, isto é, proprietários a optarem por realizar mais-valias antecipando um arrefecimento dos preços para os próximos meses”. Mas esta dinâmica não deverá culminar numa redução dos preços das casas à venda a nível nacional, mas sim numa estabilização, porque “a procura tem-se mantido superior à oferta habitacional disponível no mercado”, tal como lembra o CEO da ERA Portugal.

“Aquilo que temos sentido é que as decisões de compra têm estado mais lentas, e que abrandou a subida de preços, nomeadamente nos imóveis usados”, Rafael Ascenso, diretor geral da Porta da Frente Christie’s

“Os preços não serão assim tão elásticos ao ponto de, como seria de esperar, baixassem proporcionalmente, de modo a encontrar um novo ponto de equilíbrio entre a ‘nova’ procura e a mesma oferta”, comenta Luís Nunes, da ComprarCasa, admitindo contudo, que os preços das casas vão manter-se estáveis a nível nacional, uma vez que continua a haver falta de construção nova.

Já Beatriz Rubio acredita que a evolução dos preços das casas no nosso país poderá variar consoante a localização: “Existem zonas e regiões com relativamente pouca dinâmica e outras com maior rotatividade dos imóveis, assim como algumas onde são esperadas reduções de preços e outras, pelo contrário, verão os seus imóveis serem mais valorizados. Quer isto dizer que em zonas onde os preços se mantenham em valores relativamente altos e em que não haja um aumento significativo da oferta, naturalmente que continuaremos a assistir às deslocações da procura”, esclarece a CEO da Remax Portugal.

Também Ricardo Sousa, da C21, confia que os imóveis residenciais vão continuar a ser um refúgio num atual momento marcado pela incerteza. “Não é expectável uma depreciação nos valores das habitações no curto prazo. Este facto permite que os proprietários se sintam mais defendidos do risco, da urgência de vender, ou da necessidade de efetuar uma troca de casa”, resume.

FONTE: Idealista

IMT muda (muito) com o OE2023… e afeta o setor – explicamos tudo

O idealista/news ouviu vários fiscalistas e juristas sobre o impacto das alterações do Orçamento do Estado no setor imobiliário.

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Autores
 Leonor Santos 
 Tânia Ferreira

A aprovação da Lei do Orçamento do Estado para 2023 (OE2023) trouxe várias alterações fiscais com impacto no setor imobiliário, nomeadamente ao nível do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT). Uma das grandes mudanças prende-se com a atualização dos escalões, mas também há regras mais apertadas na revenda de imóveis, assim como novidades na tributação de criptoativos e permutas técnicas. Para melhor entender o que está em causa e avaliar os efeitos destas novas medidas nos negócios imobiliários, o idealista/news ouviu vários fiscalistas e juristas. Eis um resumo do que vai mudar no IMT em 2023.

Principais alterações do OE2023 ao Código do IMT​​​​​​​

Os fiscalistas e juristas destacam as seguintes alterações ao Código do IMT:

  • Atualização dos escalões do IMT;
  • Regras mais apertadas na revenda de imóveis;
  • Nova tributação de criptoativos;
  • Restrições às regras das permutas.

Explicamos de seguida, em detalhe, em que consistem estas alterações e o seu impacto.

Atualização dos escalões de IMT para prédios habitacionais

  • Isenção de IMT para casa destinada à habitação sobe para 97.064 euros

A atualização dos escalões previstos para a determinação da taxa de IMT aplicável à transmissão de prédios urbanos, ou de frações autónomas de prédios urbanos, destinados exclusivamente a habitação, fixou-se nos 4%. Em virtude desta atualização, no caso de aquisição de prédio urbano ou de fração autónoma de prédio urbano destinado a habitação própria e permanente, só é devido IMT se o valor sobre o qual incide o imposto for superior a 97.064 euros, sendo que, anteriormente, o valor era 93.331 euros.

Por outro lado, Diogo Gonçalves Pires e Daniela Lopes Silva, fiscalistas da PwC, esclarecem que “mantêm-se as taxas de 5% para a aquisição de prédios rústicos e 6,5% para a aquisição de prédios urbanos não afetos a habitação e outras aquisições onerosas”. Paralelamente, referem, “mantém-se também a taxa agravada de 10% sempre que o adquirente tenha domicílio fiscal em paraíso fiscal ou seja uma entidade dominada ou controlada, direta ou indiretamente, por uma entidade domiciliada em paraíso fiscal”.

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Regras mais apertadas na revenda de imóveis

  • Isenção de IMT para quem comprove que nos últimos 2 anos revendeu imóveis antes adquiridos para esse fim

“Antes da entrada em vigor do OE2023, os sujeitos passivos que adquirissem imóveis com o propósito da respetiva revenda podiam beneficiar de uma isenção de IMT se verificados um conjunto de requisitos (que se mantêm). Esta isenção fiscal podia operar logo no momento da aquisição do imóvel, caso o sujeito passivo comprove que, no ano anterior, adquiriu um imóvel destinado a revenda ou vendeu um imóvel adquirido com esse fim”, começa por explicar Tiago Rosa, Associate Partner da EY.

Contudo, sublinha, e com as alterações introduzidas pelo Orçamento do Estado deste ano, “para que a isenção se aplique no momento da aquisição, os sujeitos passivos passarão a ter de demonstrar que procederam à revenda de prédios adquiridos com esse fim nos dois anos precedentes à aquisição”.

Diogo Gonçalves Pires e Daniela Lopes Silva consideram que alteração introduzida vem aumentar as restrições de aplicação da referida isenção “à cabeça”, o que pode levar ao “adiamento de algumas operações (até que as condições agora exigidas passem a ser cumpridas) ou até mesmo inviabilizar alguns negócios face ao dispêndio de IMT antes evitável”. De acordo com os fiscalistas da PwC, seria “positivo haver uma reflexão séria sobre o mérito e oportunidade deste imposto ou, no mínimo, o nível de taxas aplicável”, uma vez que “é um real entrave a negócios imobiliários”.

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Para Raquel Galinha Roque, partner da CRS Advogados e Natacha Branquinho, advogada associada da CRS Advogados, a alteração na atividade de revenda de imóveis, com a agora dupla-limitação, “veio apanhar inúmeros sujeitos passivos de surpresa, que já tinha os seus investimentos programados para o ano de 2023 e como tal serão fortemente penalizados uma vez que não se previu um regime transitório que desse uma oportunidade aos sujeitos passivos de se adaptarem a esta situação, estando a Autoridade Tributária a fazer “tábua rasa” da alteração agora introduzida”.

Uma opinião partilhada por Clélia Brás, Sócia e Responsável Nacional do Departamento de Imobiliário da PRA – Raposo, Sá Miranda & Associados. “Perante a recente alteração legislativa, caberia na nossa opinião aplicar um período transitório, permitindo assim que as sociedades pudessem dar cumprimento a tal exigência. Ao não acontecer, tal preceito legislativo, para além de poder colocar em causa a constitucionalidade da norma, mais não passa de uma forma encapotada de permitir a aplicação retroativa dessa mesma norma”, defende a responsável.

Valor dos criptoativos como base tributável de IMT

  • Criação novo quadro fiscal aplicado aos criptoativos é uma das grandes novidades do OE2023

“No plano do património, prevê-se, expressamente, a tributação das transmissões gratuitas de criptoativos, bem como a incidência de Imposto do Selo sobre as comissões cobradas na intermediação de operações relativas a criptoativos, sujeitando estas a uma taxa de 4% (em linha com a generalidade das operações financeiras)”, lê-se na proposta do OE2023.

Os fiscalistas da PwC explicam que, “após o primeiro contrato de permuta direta realizado em Portugal (em maio de 2022) entre um imóvel e 3 Bitcoins (que valiam, à data, aproximadamente 110.000 euros), surgiu a necessidade legislativa de integrar (ou prever de forma expressa) o valor dos criptoativos na base tributável de IMT”.

Desta forma, o OE2023 veio estabelecer que, para efeitos de determinação da base tributável de IMT, passa também a considerar-se como valor do ato ou do contrato o valor dos criptoativos dados em troca, determinado nos termos do Código do Imposto do Selo, isto é, tendo em conta o valor da cotação oficial, quando exista, ou o seu valor de mercado.

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Travão às permutas de imóveis

  • Permutas técnicas” eram usadas para reduzir IMT, mas novas regras colocam entraves

De forma resumida, a permuta de imóveis consiste na troca de uma casa por outra entre duas partes interessadas que queiram vender ou comprar um imóvel. Trata-se de uma alternativa e opção viável para quem procura mudar de casa, e que contemplava várias vantagens fiscais ao nível da redução de impostos, como o pagamento do IMT.

Segundo Raquel Galinha Roque e Natacha Branquinho, da CRS Advogados, “esta opção era bastante utilizada na transação de ativos imobiliários por ser atrativa para os intervenientes que já pagavam um preço, na totalidade ou em parte, com a entrega de um imóvel seu”. “Até 1 de janeiro de 2023, o imposto que era pago incidia apenas sobre a diferença dos valores dos imóveis permutados. Ou seja, tenho um imóvel que vale 100.000 e vou comprar um imóvel pelo preço de 250.000. O IMT incidiria sobre 150.000”, começam por explicar.

Agora, e de acordo com a alteração introduzida, esta regra fica sem efeito se os bens imóveis forem transmitidos no prazo de um ano a contar da data da permuta. “Se tal se verificar o primitivo permutante que transmitiu o imóvel deve apresentar declaração de modelo oficial, no serviço de Finanças competente, no prazo de 30 dias a contar da data da transmissão para liquidar e pagar IMT na totalidade”, indicam.

Assim, de acordo com as juristas, esta norma “veio colocar um “travão” aos negócios mobiliários que utilizavam imóveis como “moeda de troca” numa ótica de investimento imobiliário. Só beneficiam da tributação parcial na permuta se se mantiverem proprietários do imóvel permutado por mais de um ano”.

O idealista/news preparou um tema exclusivamente dedicado às “permutas técnicas”, que pode ser lido aqui.

OE2023 penaliza ou beneficia o imobiliário?

Para o advogado Ricardo Matos Fernandes, o IMT sofre alterações na tributação neste OE2023 “que afetam, em muito, a atividade das empresas que se dedicam à atividade imobiliária”. Na opinião do especialista, “o legislador tentou, com as alterações que introduziu, evitar a montagem de operações que visavam uma redução ou mesmo não pagamento de IMT, e duas delas são facilmente identificáveis. A criação de empresas imobiliárias com atividade de compra e venda de imóveis com único o propósito de evitar o pagamento do IMT nas aquisições de imóveis. A outra caracteriza-se pela realização de negócios com recurso a permutas de imóveis, com o propósito de reduzir o valor de IMT a pagar pelo conjunto dos negócios realizados. As popularmente denominadas “permutas técnicas””.

Ainda assim, e para o jurista, a “eventual redução da dinâmica transacional do mercado imobiliário não se ficará a dever às alterações da tributação operadas pelo OE2023, tendo apenas impacto em algumas operações em que os intervenientes viram frustradas as suas expectativas de uma menor tributação pelo recurso às figuras e operações que o legislador quis evitar com as alterações introduzidas”. “A incapacidade de antecipação pelos operadores imobiliários deveu-se ao facto destas alterações não serem previsíveis em 2022, pois não fizeram parte da discussão da proposta inicial de orçamento para 2023 e nem da aprovação na generalidade, apenas surgiram e foram aprovadas em sede de especialidade”, refere.

negócios imobiliários
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Massimo Forte, consultor independente especializado em mediação imobiliária, não consegue ver novidades que beneficiem o setor, “apenas o penalizam”. “Por exemplo, o IMT volta a penalizar investidores imobiliários com efeitos imediatos, já tenho clientes que acompanho ao nível de consultoria de negócio e operação que tiveram de refazer o seu plano de investimentos para 2023”, refere. “Convém ainda referir que o IMT é um dos impostos mais arcaicos do mundo e utilizado em poucos países. Não se consegue perceber a utilidade e impacto real deste dinheiro que entra de forma fácil e constante nos cofres do estado, e no caso português, mais precisamente, nas autarquias”, defende.

Guia essencial de perguntas e respostas sobre o IMT

Em que situações há lugar ao pagamento do IMT?

“Tradicionalmente, há lugar ao pagamento de IMT nas transmissões onerosas do direito de propriedade ou figuras parcelares desse direito, sobre bens imóveis situados em Portugal. Porém, o legislador equiparou alguns negócios a verdadeiras transmissões de bens imóveis e/ ou transmissões onerosas. E note-se que, mesmo sem título jurídico e, ainda, em casos de onerosidade duvidosa, a lei sujeita certos negócios ao pagamento deste imposto”, tal como explicam Raquel Galinha Roque e Natacha Branquinho, da CRS Advogados.

Segundo as juristas, há lugar ao pagamento de IMT em situações como:

  • A entrada de imóveis para a realização do capital social das sociedades;
  • Excesso da quota-parte em partilhas;
  • Arrendamento com cláusula de transmissão;
  • Arrendamentos e subarrendamentos a longo prazo;
  • Contratos-promessa de aquisição e alienação de imóveis, logo que verificada a tradição;
  • Cedências de posição contratual;
  • Alienação das heranças ou de quinhões hereditários.
pagar IMI
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Pagamento do IMT sobre os negócios e transações

Clélia Brás, da PRA, clarifica que o pagamento de IMT é exigido na aquisição de partes sociais ou de quotas nas sociedades, caso se verifiquem os seguintes pressupostos:

  • O valor do ativo da sociedade resulta, direta ou indiretamente, em mais de 50% por bens imóveis situados em território nacional. Para o efeito, é tido em conta o valor de balanço ou, se superior, o Valor Patrimonial Tributário;
  • Estes imóveis não estarem diretamente afetos a uma atividade de natureza agrícola, industrial ou comercial, excluindo a compra e venda de imóveis;
  • A aquisição, amortização ou outros factos fazem com que um dos sócios passe a dispor de, pelo menos, 75% do capital social, ou, quando os sócios sejam apenas duas pessoas casadas ou unidas de facto.

“No que concerne à aquisição de unidades de participação em fundos de investimento imobiliário, tal aquisição também poderá ser passível de liquidação em sede de IMT. No entanto, tal só se verifica se um dos titulares ou dois titulares casados ou unidos de facto passarem a ter, pelo menos, 75% das unidades de participação (UP) do fundo”, indica a especialista, “frisando que a realização de capital em sociedades ou fundos de investimento imobiliário, se efetuada mediante bens imóveis, também poderá estar sujeita ao pagamento de IMT”.

Pagamento do IMT no arrendamento

Tiago Rosa, Associate Partner da EY, Tax Services, explica que, nos termos gerais, aplica-se IMT em situações de arrendamento cujo contrato preveja:

  • uma cláusula de que os bens arrendados se tornam propriedade do arrendatário depois de satisfeitas todas as rendas acordadas;
  • ou arrendamentos ou subarrendamentos a longo prazo, considerando-se como tais os que devam durar mais de 30 anos, quer a duração seja estabelecida no início do contrato, quer resulte de prorrogação, durante a sua vigência, por acordo expresso dos interessados, e ainda que seja diferente o senhorio, a renda ou outras cláusulas contratuais.
arrendar casa
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Pagamento do IMT no caso das heranças

No caso das heranças, dizem Raquel Galinha Roque e Natacha Branquinho, da CRS advogados, há que distinguir várias realidades. “Na partilha de uma herança, o IMT vai incidir sobre o excesso da quota-parte que ao adquirente – herdeiro – pertencia. Por exemplo se o adquirente tinha uma quota-parte de 50% de uma herança composta por 1 imóvel e em sede de partilhas ficam com a totalidade do imóvel, ou seja, 100%, a lei prevê que sobre os 50% que fica em excesso paga IMT”, explicam.

Por outro lado, também existem negócios jurídicos sobre heranças. “Ou seja, um herdeiro pode vender uma herança ou o seu quinhão hereditário a um terceiro, que pode não ter qualquer relação com a herança. E estes negócios ficam também sujeitos a IMT”, indicam as especialistas.

Isenção do IMT: quem tem direito

Clélia Brás, da PRA, recorda que a isenção de IMT incide quando a aquisição é efetuada por:

  • Imóveis adquiridos por organismos do Estado, autarquias e associações e federações de municípios de direito público;
  • Imóveis adquiridos para sede de missões diplomáticas, pessoas coletivas com estatuto de utilidade pública, IPSS e pessoas coletivas religiosas;

Outras situações em que não há lugar ao pagamento do IMT:

Tal como refere a especialista, “a aquisição de prédios individualmente classificados como de interesse nacional, público ou municipal, assim como a aquisição de locais para a realização espetáculos culturais também estão entre as isenções previstas. Também comungam de isenção, a compra de prédios para revenda e a aquisição, por parte de instituições de crédito, de imóveis em processos de execução, falência, insolvência ou em dação em cumprimento”.

“É quase impossível construir habitação acessível” em Portugal

Em entrevista, os autores do livro “Políticas Locais de Habitação” explicam os problemas do setor da habitação e sugerem soluções.

Falta de casas em Portugal
Paulo Valença, Álvaro Santos e Miguel Branco-Teixeira, autores do livro “Políticas Locais de Habitação”DR
Autores
 Vanessa Sousa 
 Tânia Ferreira

falta de habitação digna e acessível é uma questão urgente em Portugal. Há várias políticas de habitação em marcha, como é o caso do Programa 1º Direito e o Programa de Arrendamento Acessível, que vão contar com um reforço do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR). Mas não chega para dar casas dignas habitação acessível a todas as famílias que delas precisam. “Com a carga fiscal e todos os custos de contexto atualmente existentes, é quase impossível construir habitação acessível, tanto pela via privada como pela pública”, apontam os autores do livro “Políticas Locais de Habitação” Álvaro Santos, Miguel Branco-Teixeira e Paulo Valença, em entrevista conjunta ao idealista/news.

Nova Geração de Políticas de Habitação foi lançada em 2017 para criar habitação digna para as famílias. Mas os “resultados deste pacote legislativo tardam a aparecer”, realçam os especialistas. A taxa de execução do Programa 1º Direito é ainda “muito baixa”, avaliam. E os resultados do Programa de Arrendamento Acessível têm sido “fracos”, dizem.

Para dar um novo fôlego a estas políticas públicas de habitação, o Governo destinou mais de 2,7 mil milhões de euros do PRR para reforçar o parque habitacional público e reabilitar habitações indignas. Mas “os problemas habitacionais em Portugal não se resolverão completamente no horizonte de quatro anos”, sendo, por isso, “fundamental pensar para além de 2026”, destacam ainda Álvaro Santos, Miguel Branco-Teixeira e Paulo Valença.

“Os municípios poderão ser a chave para o sucesso dos programas de arrendamento acessível

Por onde passa, então, a solução para dar casas dignas aos portugueses no longo prazo? “Importa, pois, unir esforços para resolver o gravíssimo problema de falta de casas dignas”, consideram os autores do livro recém-lançado. A receita passaria, portanto, por aproveitar o financiamento do PRR e também pela maior participação dos municípios na resolução do problema da habitação, que devem assegurar, desde logo, que cada autarquia possui um pelouro da Habitação autónomo.

Além disso, “a resolução do problema da habitação não pode ser apenas acometida à intervenção pública, sendo fulcral integrar neste propósito o setor privado”, defendem. E para que os investidores e promotores imobiliários sejam mais ativos na construção de casas acessíveis aos rendimentos das famílias há que “simplificar e reduzir a excessiva morosidade dos processos de licenciamento” e “promover uma política fiscal justa, equilibrada e competitiva no domínio da habitação”, consideram ainda.

Analisando o passado do setor habitacional, os autores do livro acreditam que é possível começar a traçar o caminho certo para o futuro da habitação em Portugal. Foi da vontade comum de partilhar um pouco da sua experiência e do trabalho desenvolvido junto dos municípios que os três autores decidiram escrever o livro “Políticas Locais de Habitação”, que foi apresentado no passado dia 10 de janeiro, no Porto. E será também exibido no próximo dia no dia 2 de fevereiro, às 18h, na sede nacional da Ordem dos Engenheiros, em Lisboa, uma cerimónia será presidida pela própria ministra da Habitação Marina Gonçalves.

Estes são os seus perfis resumidos:

  • Álvaro Santos: sócio-gerente da Agenda Urbana e coordenador da Pós-Graduação em Reabilitação do Património Construído na Universidade Fernando Pessoa;
  • Miguel Branco-Teixeira: professor e coordenador da Licenciatura e do Mestrado em Engenharia Civil na Universidade Fernando Pessoa;
  • Paulo Valença: consultor e projetista nas áreas da Arquitetura, do Urbanismo e do Planeamento Territorial.

A publicação conta também com o testemunho de 26 pessoas como Marina Gonçalves, atual ministra da HabitaçãoCarlos Moedas, presidente da Câmara Municipal de Lisboa; Pedro Baganha, vereador de Urbanismo e da Habitação da Câmara Municipal do Porto; Hugo Santos Ferreira, presidente da APPII; ou Manuel Reis Campos, presidente da AICCOPN.

Em entrevista conjunta ao idealista/news, por escrito, os autores do livro explicam qual é o estado da arte das políticas públicas de habitação no nosso país e dão pistas sobre como se pode traçar um futuro melhor nesta matéria.

Políticas públicas de habitação
Foto de Ryutaro Tsukata no Pexels

Como avaliam a Nova Geração de Políticas de Habitação (NGPH) e, em particular, as políticas locais de habitação desenvolvidas nos últimos anos (Programa 1º Direito, Programa de Arrendamento Acessível, reforma do Porta 65, etc)?

Este pacote legislativo lançado em outubro de 2017 visava em geral:

  • garantir o acesso a todas as famílias a uma habitação adequada;
  • criar as condições para que a reabilitação do edificado e a reabilitação urbana passem de exceção a regra e se tornem nas formas de intervenção predominantes, tanto ao nível dos edifícios como das áreas urbanas.

No entanto, apesar de haver sinais positivos, os resultados deste pacote legislativo tardam a aparecer. O setor habitacional, designadamente o de cariz mais social ou apoiado, tem tradicionalmente uma grande inércia e as dificuldades são muitas, pelo que não é fácil concretizar obras e resolver as carências habitacionais das famílias sem que o processo se sustente, de facto, num outro paradigma mais abrangente. Importa todavia reconhecer que estão a ser feitos esforços para melhorar a atual situação.

No que respeita ao Programa 1º Direito, embora se tenha iniciado há cerca de 4 anos, os dados conhecidos indicam também que a sua taxa de execução é ainda, infelizmente, muito baixa. Com efeito, a implementação do 1º Direito não tem sido fácil, sendo possível identificar um conjunto de dificuldades direta ou indiretamente relacionadas com o setor habitacional que têm contribuído para este facto.

Dificuldades diretamente relacionadas com o setor habitacional:

  • o grande número de documentos legislativos e normativos sobre o setor habitacional e a dificuldade na sua compreensão;
  • a situação de ilegalidade em que se encontram muitas habitações;
  • a complexidade do Programa 1º Direito, nomeadamente com diversas duplicações de requisitos e funções entre as câmaras municipais e o Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU);
  • o carácter experimentalista do Programa, com muitos procedimentos a serem elaborados em simultâneo com a sua aplicação concreta;
  • a desadequação dos custos previstos no Programa 1º Direito, face à realidade do mercado;
  • a escassez de recursos humanos das câmaras municipais e do IHRU;
  • o défice de conhecimentos e competências específicas de muitos técnicos municipais escalados para colaborar na área habitacional.

Dificuldades indiretamente relacionadas com o setor habitacional:

  • a constante e significativa subida da inflação;
  • a falta de mão de obra que se verifica no setor da construção, maximizada pelo grande volume de obras que decorre em simultâneo neste período;
  • a escassez de materiais, agravada pelo grande aumento de alguns preços;
  • a complexidade e diversidade das questões relacionadas com cadastro das propriedades;
  • a elevada carga burocrática, sentida particularmente no campo da justiça e do urbanismo;
  • a iliteracia de muitos agregados familiares;
  • a dificuldade e morosidade dos processos de contratação pública.

Estas dificuldades têm criado muitos entraves à execução do Programa do 1º Direito, observando-se situações de algum desânimo e mesmo de desistência de algumas candidaturas.

Contudo, e apesar das dificuldades, existem vários fatores que concorrem para que a materialização do 1º Direito possa ter bons resultados. Repare-se que há, neste momento, condições financeiras únicas, designadamente as provenientes das verbas do PRR, um plano que destina 1,21 milhões de euros ao 1º Direito. Repare-se ainda – e isto é essencial – que todos os intervenientes neste processo, Governo, IHRU, câmaras municipais, promotores imobiliários, construtores, projetistas e famílias estão muito empenhados no sucesso do Programa 1º Direito e tudo farão para que isso seja possível.

Importa, pois, unir esforços para ultrapassar as dificuldades agora identificadas, aproveitando esta oportunidade para resolver um gravíssimo problema que afeta milhares de famílias que, em pleno século XXI, continuam a não ter uma habitação digna para residir.

Construção de casas acessíveis
Foto de Sascha Weber no Pexels

Como veem a criação do novo ministério da Habitação para a criação e execução destas políticas de habitação? E o objetivo assumido pelo Governo no OE2023 de apostar em mais habitação acessível?

Entendemos como muito positiva a criação do ministério da Habitação. Desta forma, o tema da Habitação ganha mais visibilidade e passa a “sentar-se” à mesa do Conselho de Ministros. Até porque num momento em que o início da concretização da Nova Geração de Políticas de Habitação está em curso, manter a equipa governativa que disso tratava trará, por certo, ainda mais eficiência a este setor.

Mas apenas isto não basta para resolver os problemas da habitação que são ciclópicos e que necessitam de uma forte intervenção e empenhamento por parte de agentes públicos, privados, do setor social e dos próprios agregados familiares.

“O papel dos municípios pode ser muito relevante, nomeadamente por via da criação de Programas Municipais de Arrendamento Acessível”

Como avaliam o objetivo assumido pelo Governo no OE2023 de apostar em mais habitação acessível?

A aposta na habitação acessível é fundamental para minimizar as imensas dificuldades que a população portuguesa de rendimentos intermédios está a sentir para aceder a uma habitação digna, em particular os mais jovens. Infelizmente, hoje, o problema não se põe apenas no âmbito da falta de habitação e das condições indignas de habitabilidade, põe-se também na incapacidade – que é cada vez maior – de fazer frente aos valores de renda de mercado e também, ainda com maior impacto, na incapacidade de adquirir casa nova.

Contudo, e apesar do Programa de Arrendamento Acessível já ter sido criado há cerca de 3 anos, os resultados têm sido fracos. Desde 2019, apenas foram assinados 900 contratos de arrendamento, o que equivale a cerca de 0,4% do total, estando longe da meta de 20% estabelecida. É muito pouco.

Mas, apesar de o Programa de Arrendamento Acessível de âmbito nacional apresentar resultados medíocres, a verdade é que alguns municípios já criaram os seus próprios programas de âmbito local e têm apresentados muito bons resultados.

O papel dos municípios pode ser muito relevante, nomeadamente por via da criação de Programas Municipais de Arrendamento Acessível que, ao abrigo da legislação nacional já existente, possam contribuir para promover uma oferta alargada de habitação para arrendamento a preços reduzidos, compatíveis com os rendimentos dos agregados familiares, de acordo com a taxa de esforço e tipologia de modo a colmatar as necessidades habitacionais das famílias.

A lógica deste programa é o da criação de uma contrapartida com vantagens para ambas as partes. Os senhorios que aceitem colocar os seus imóveis no programa com rendas reduzidas têm garantida a isenção de IRS ou IRC sobre as rendas. Já os arrendatários têm acesso a uma habitação a custos mais acessíveis, compatíveis com o seu rendimento.

A verdade é que o atual problema da habitação em Portugal não é tanto de falta de habitações, mas de falta de habitações onde elas sejam necessárias, em boas condições e a preços comportáveis face aos rendimentos das famílias, principalmente das famílias de jovens. Importa aqui sublinhar que, de acordo com os Censos de 2021, existem 723 mil fogos vagos em Portugal (160 mil na Grande Lisboa e 84 mil no Grande Porto). A mobilização de muito deste edificado existente, desocupado e de propriedade privada, poderia contribuir decisivamente para resolver, pelo menos, uma grande parte das carências habitacionais existentes atualmente. Até porque não é manifestamente possível disponibilizar casas para todos só com dinheiros públicos.

Por isso, consideramos que os municípios poderão ser a chave para o sucesso dos programas de arrendamento acessível, uma vez que poderão assegurar o “factor de confiança” que falta atualmente ao mercado, constituindo-se como intermediários entre proprietários e inquilinos.

Arrendamento acessível em Portugal
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O Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) tem mais de 2,7 mil milhões de euros destinados à habitação, para reforçar o parque habitacional público e reabilitar habitações indignas. Como avaliam a aplicação desta verba nas políticas de habitação a nível local? Consideram 2026 um prazo adequado para a concretização das metas propostas?

É perfeitamente compreensível que os gestores públicos procurem alcançar o maior financiamento possível para criar melhores condições habitacionais para os seus concidadãos. Este objetivo é alcançável ao abrigo do PRR no curto prazo. Contudo, e infelizmente, será consensual considerar que os problemas habitacionais em Portugal não se resolverão completamente no horizonte de quatro anos. Por isso, é importante aproveitar a oportunidade única do PRR, mas é fundamental pensar para além de 2026.

Para isso, considera-se necessário prosseguir o esforço que atualmente se está a desenvolver em termos de criação de melhores condições habitacionais para os portugueses, com uma estratégia de médio e longo prazo que seja capaz de assegurar que o “direito à habitação”, constitucionalmente consagrado, seja um desígnio nacional, permanente e sustentável, e que assegure também os legítimos interesses e expectativas das gerações futuras.

No entanto, refira-se que as regras impostas pelo PRR para o financiamento a 100% de fundo perdido, em matéria de condições térmicas e energéticas, é demasiado ambicioso, exatamente tendo em conta o universo de população a que se destina prioritariamente, as famílias que vivem em condições indignas. Exigir, em novas edificações e em grandes transformações, o atingir de níveis do NZEB (‘Nearly-Zero Energy Building’) superiores aos das novas construções que se produzem, parece exagerado. E responder as estas regras com equipamentos consumidores de energia e assim aumentar a fatura das famílias que vivem com parcos recursos, parece um contrassenso. A iliteracia existente e a incapacidade económica e financeira, não estão a ser tidas em linha de conta.

“Em muitos municípios portugueses o pelouro da Habitação ou não existe ou está integrado com a Ação Social (…) o que resulta numa menor atenção dedicada aos problemas da falta de habitação”

“Os municípios portugueses devem assumir um papel fundamental na resolução do problema da habitação em Portugal”, disseram na apresentação do livro. De que forma o podem fazer? Que constrangimentos devem ser ultrapassados para que o papel das autarquias possa ser reforçado (ao nível da legislação, regulação, licenciamento e financiamento da habitação)?

Os municípios têm um contacto direto e privilegiado com a população, sendo os autarcas e os técnicos municipais quem melhor conhece o território e as suas necessidades. E, por isso, cabe aos municípios planear e executar as respetivas políticas municipais de habitação, identificando as carências e disfunções do parque habitacional, bem como as suas dinâmicas evolutivas, tendo como objetivo encontrar as respostas mais adequadas para resolver os problemas e potenciar as oportunidades de desenvolvimento no quadro das políticas habitacionais e em articulação com as restantes políticas locais. Também no universo autárquico, as Juntas de Freguesia, entidades de proximidade ao mundo real, são cruciais na deteção de problemas e na procura de soluções.

Mas, se por um lado, é indiscutível o papel de fundamental relevância que os municípios podem desenvolver em prol da provisão de habitação para as suas populações, a verdade é que ainda existe uma generalizada escassez de recursos humanos e financeiros afetos a este domínio – à exceção dos maiores municípios ou daqueles que estão localizados nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto. Aliás, em muitos municípios portugueses o pelouro da Habitação ou não existe ou está integrado com a Ação Social, assumindo um papel secundário na agenda de técnicos e gestores públicos, o que resulta numa menor atenção dedicada aos problemas da falta de habitação.

Estamos em crer que esta situação não poderá, nem deverá, manter-se. Pelo contrário. O que se preconiza é uma aposta estratégica na Habitação ao nível local. Para isso, considera-se imperioso, desde logo, a criação e autonomia do pelouro da Habitação nos municípios onde ainda não exista. Haver um vereador dedicado ao pelouro da Habitação é absolutamente crítico para promover a articulação com o IHRU, por exemplo.

Naturalmente que a criação, ou a existência, do pelouro da Habitação implica um reforço dos recursos financeiros e humanos de modo que os múltiplos desafios possam ter uma resposta célere e eficaz. Uma das suas funções seria verter a estratégia municipal de habitação nas estratégias de planeamento territorial, que deve ser feito no quadro das Cartas Municipais de Habitação em articulação com os Planos Diretores Municipais. Este trabalho é crucial para o bom equilíbrio e desenvolvimento espacial municipal e rentabilização de infraestruturas e equipamentos.

Construção de casas baratas
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Consideram as políticas público-privadas uma alternativa viável para criar mais habitação acessível para as famílias portuguesas de rendimentos médios? Porquê e de que forma poderiam funcionar?

A resolução do problema da habitação não pode ser apenas acometida à intervenção pública, sendo fulcral integrar neste propósito o setor privado. Para isso, consideramos fundamental atuar em duas dimensões estratégicas:

  • Simplificar e reduzir a excessiva morosidade dos processos de licenciamento

É amplamente reconhecido que, em Portugal, o licenciamento urbanístico regista níveis de burocracia e tempos de resposta ainda muito morosos e que são inaceitáveis. O caos do licenciamento urbanístico está longe de estar resolvido, até porque o licenciamento é um processo de difícil agilização.

Durante as últimas décadas, aumentou a burocracia, a opacidade e com isso aumentaram também os tempos de resposta e a imprevisibilidade afugenta muito os investidores. Até porque o elevado tempo de decisão conflitua ainda com a gestão financeira da promoção imobiliária, gerando, muitas vezes, custos extraordinários que acabam por se refletir nos preços finais das casas.

Esta lentidão impacta negativamente em todo o setor, em particular nos pequenos promotores e nas cooperativas de habitação que não conseguem aguentar o tempo perdido nas listas de espera dos licenciamentos, muitas vezes com períodos de decisão superiores a um ano, retirando competitividade ao setor e inviabilizando o acesso dos portugueses a um direito constitucionalmente protegido, a Habitação.

É verdade que já vários municípios estão a fazer um esforço enorme para criarem as melhores condições para atraírem investimento privado, reduzindo ao máximo os tempos de espera dos licenciamentos urbanísticos. Mas o certo é que a legislação nacional impõe ainda prazos que não são compatíveis com a necessidade de uma maior celeridade no processo de apreciação administrativa.

Por tudo isto, urge promover a celeridade, a simplificação e a transparência do licenciamento urbanístico, criando ambientes administrativos desburocratizados e agilizadores dos projetos, em prol do desenvolvimento das atividades económicas, do investimento nas cidades e nos municípios e, também, como forma de disponibilizar rapidamente mais habitação, em particular a preços acessíveis.

  • Promover uma política fiscal justa, equilibrada e competitiva no domínio da habitação

Portugal é dos poucos países na Europa onde o IVA na habitação não é reduzido nem dedutível. Repare-se que o IVA a 23% na construção representa um dos maiores custos de um projeto imobiliário. Uma diminuição do IVA em Portugal incentivaria certamente o investimento no imobiliário, trazendo uma nova dinâmica ao setor e gerando mais oferta habitacional.

Portugal tem ainda duplicação de impostos, como é o caso do AIMI (Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis), que atinge mais de 500 mil imóveis. Com este nível de asfixia fiscal facilmente se percebe porque é que existe uma grande escassez de oferta habitacional em Portugal e, também, que é inviável construir habitação a preços acessíveis.

Com a carga fiscal e todos os custos de contexto atualmente existentes é quase impossível construir habitação acessível, tanto pela via privada como pela pública, como já se começa a verificar.

Casas acessíveis em Portugal
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Esta obra pretende “contribuir para a análise do passado do setor habitacional para, através dele, se poder melhor enquadrar o presente e começar a traçar o caminho certo para o futuro”. Qual é, na vossa perspetiva, o melhor caminho para seguir no que diz respeito às políticas locais de habitação?

Entendemos ter chegado o momento de fazer uma primeira reflexão sobre a forma como as políticas, os instrumentos e as medidas concretas traçadas para o setor habitacional estão a ser implementadas no território. É para contribuir para esta reflexão que surge este livro, onde se procura analisar e avaliar as novas políticas de habitação à luz desse novo papel que os municípios podem e devem desempenhar na provisão de habitação.

Ficamos com a consciência de que estas propostas não são simples e que implicam, sobretudo e necessariamente, um processo partilhado de planeamento, reorganização e modernização. Neste sentido, é agora a altura de convocar todos aqueles que estão interessados neste domínio, atores públicos e privados, mobilizando-os para percorrer, em conjunto, um caminho que tem uma causa comum e muito nobre – a melhoria das condições da habitação em Portugal.

*Notícia atualizada dia 13 de janeiro, às 14h27, com a nota da apresentação do livro “Políticas Locais de Habitação” no próximo dia dia 2 de fevereiro, em Lisboa.

FONTE : Idealista